Por Gabriel Pinheiro

“Entre o escrito e o sonhado” foi tema de mesa que transbordou a poesia dos versos e dos gestos 

Marcelino Freire, Calila das Mercês e Geni Núñez se reuniram na mesa “Entre o escrito e o sonhado” na noite deste sábado no 13.º Fliaraxá – Festival Literário Internacional de Araxá, numa conversa que tocou nas poéticas que compõem os projetos literários de cada convidado. “Essa mesa é um convite que abre muitas portas. A gente pro trabalho dos dois e vê uma imensidão”, comentou a mediadora Geni Nuñez no início da conversa, sobre os trabalhos. 

Na sequência, ela perguntou para Calila das Mercês sobre a sinestesia que o trabalho dela apresenta. Mercês abriu sua fala agradecendo a Marcelino Freire: “Se existe [meu livro] ‘Planta oração’, eu devo muito a Marcelino Freire”, celebrou. “Eu tenho feito esse movimento de pensar essa sinestesia. Essa vontade de sentir, de dialogar com os leitores. De permitir essa andança por uma floresta, por um ambiente que permita a você sentir a terra de uma maneira que não seja cartesiana”, declarou Calila. “‘Vingar’ é uma palavra que a planta nos ensina. Quando a planta ‘vinga’, quer dizer que não deu tudo errado. A palavra, a gente lapida. A palavra, a gente lavra”.

Marcelino Freire abriu sua fala celebrando Calila das Mercês. “Eu me vingo com amor também. O mundo tá tão odioso, que o amor, esse afeto, nos dá alimento para continuar fazendo as coisas que a gente faz”, comentou o escritor. Freire agradeceu ao Fliaraxá e à sua equipe. Vestindo uma camisa repleta de livros estampados, ele comentou: “Eu estou vestindo livros, estou vestindo autorias, estou vestindo abraços. Obrigado a todos que fazem esse festival acontecer”.

“Eu escrevo pra me vingar. (…) E também escrevo para dar vida às pessoas que já me deixaram. (…) Eu quero restituir essas falas, eu quero restituir esses diálogos. Eu escrevo, às vezes, falando com a voz de minha mãe”, Freire prosseguiu. “A minha esperança é que a minha literatura transforme esse gesto de amor e afeto em um gesto coletivo.”

Calila das Mercês compartilhou com o público uma história com Marcelino Freire. Quando ela venceu o Prêmio Toca Literária, organizado por Marcelino e pela editora Simone Paulino, da Nós. “Esse livro me dá muita alegria. Foi um espaço onde eu pude falar de uma circularidade que me acompanha. Eu sou do interior, tenho esse imaginário de uma cidade pequena. (…) Esse lugar muito ligado à terra me acompanha. Essa conexão com a natureza. (…) O respeito com o tempo, com a chuva, com a natureza”, comentou. “Muita gente diz que é ‘mãe de planta’, ‘pai de planta’. Mas a gente esquece que a natureza é a mãe”, acrescentou.

Geni Nuñez comentou que o verso habita Marcelino Freire de tal forma que, mesmo quando seu texto não é poema, é poético. O escritor, então, citou Manoel Bandeira. “O que não tenho e desejo, é que melhor me enriquece”. Os versos são do poema “Testamento”. Marcelino comentou que outros versos do mesmo poema transformaram a sua vida: “Criou-me, desde eu menino/ Para arquiteto meu pai./ Foi-se-me um dia a saúde…/ Fiz-me arquiteto? Não pude!/ Sou poeta menor, perdoai!”.

“Gente, eu me sinto tão nutrida, tão grata de estar aqui agora, de verdade”, comentou Geni Nuñez logo em seguida. A mediadora, então, perguntou para Calila sobre sua experiência na produção artesanal de livros. “Esse trabalho artesanal se dá como uma provocação”. Ela compartilhou com o público outra história, dessa vez com Conceição Evaristo, antes de publicar seu livro de estreia. “Você escreve? Pois escreva”, aconselhou Evaristo em um encontro com ela. “Eu queria escrever meu primeiro livro com minhas próprias mãos. Eu queria experimentar com minhas próprias mãos”, ela comentou sobre esse seu primeiro livro artesanal de apenas 30 exemplares.

A mediadora Geni Nuñez pediu para que os convidados falassem sobre seus novos projetos. Marcelino Freire leu para o público um trecho de seu romance mais recente, “Escalavra”: “Eu escrevia cartas para dizer como eu estava, se havia encontrado um emprego em São Paulo. E aproveitava para citar, entre as linhas, uma poesia”, começou o trecho. “Cá entre a gente, eu tenho uma preguiça muito grande de escrever”, brincou Marcelino ao falar sobre projetos futuros. “Escrever é energia. Quando a energia de um texto não acontece, eu fico arrasado. Mas eu entendo que não é a energia daquele momento, daquela frase. (…) Quando a energia acontece, eu fico muito contente. Sinto que cheguei em algum lugar. Essa energia é aquela que eu entrego para o leitor”. 

“Eu escrevo sempre.Tenho uma promessa de um novo romance. Uma coisa que eu posso contar é que desde o ano passado estou viajando pelo nordeste e foi em uma viagem de ônibus do Maranhão até o Piauí que eu encontrei a voz de uma personagem. E foi a partir dessa voz que tudo começou”, comentou Calila das Mercês sobre seu futuro romance.

Sobre o 13.º Fliaraxá

O 13.º Fliaraxá ocorre de 1.º a 5 de outubro, no Teatro CBMM do Centro Cultural Uniaraxá. O evento acontece em mesas de conversa com escritores, lançamentos de livros, prêmio de redação, atividades para as crianças, apresentações musicais, entre outras. Todas as atividades do Festival são gratuitas.

Há 13 anos, a CBMM apresenta o Festival Literário Internacional de Araxá – Fliaraxá –, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, com a parceria da Bem Brasil e o apoio cultural do Centro Cultural Uniaraxá, da TV Integração e da Academia Araxaense de Letras.

Serviço:

13.º Festival Literário Internacional de Araxá – Fliaraxá

De 1.º a 5 de outubro, quarta-feira a domingo

Local: programação presencial no Teatro CBMM do Centro Cultural Uniaraxá (Av. Ministro Olavo Drummond, 15 – São Geraldo), e programação digital no YouTube, Instagram e Facebook – @‌fliaraxa

Entrada gratuita