Por Gabriel Pinheiro

Mesa final da Programação Nacional/Internacional desta edição reuniu a homenageada Scholastique Mukasonga, Jamil Chade e Sérgio Abranches

A mesa que encerrou a Programação Nacional/Internacional deste Fliaraxá – Festival Literário Internacional de Araxá recebeu a autora homenageada, a ruandesa Scholastique Mukasonga, e o jornalista e escritor Jamil Chade, ao lado do mediador da noite, o curador Sérgio Abranches, para uma celebração da vida e da literatura, frente aos horrores do ontem e do hoje.

Sérgio Abranches abriu a mesa festejando todos os autores presentes nesta edição do Fliaraxá: “A gente quer fazer de nossos festivais essa espécie de micro-utopia (…) Para que a gente possa viver a diferença sem qualquer tipo de distinção e em um ambiente de diversidade”, declarou. O curador também agradeceu a todos os colaboradores que fazem o festival acontecer. “Todas as pessoas que proporcionam pra gente essa segurança, esse conforto, esse carinho”.

Na sequência, Abranches falou sobre a escritora homenageada, Scholastique Mukasonga: “Scholastique é uma pessoa da qual eu tenho muita admiração, muito afeto. Quero muito que ela volte”. Ele também elogiou Jamil Chade, uma das vozes mais importantes do jornalismo brasileiro contemporâneo. “Ele é um repórter. E esse é o melhor elogio que um jornalista pode receber. É alguém que vai pra rua e corre risco. Jamil tem feito isso na questão dos direitos humanos e dos refugiados.”

“Eu queria começar falando sobre os refugiados, os exilados, aqueles que são descolados de suas terras pela violência. Você é uma dessas pessoas, Scholastique”, destacou Sérgio Abranches, pedindo para que, então, Scholastique Mukasonga falasse sobre seu exílio. “Às vezes, na vida, a gente tem que fazer escolhas. (….) A gente pode ser exilar por nós mesmos. No meu caso, foi um exílio forçado. Quando meus pais notaram que não havia nada mais a fazer, eles decidiram que eu tinha que ir”, ela compartilhou. “Toda ideologia de genocídio começa por desumanizar. (…) Por isso que éramos chamados de baratas. Barata é uma coisa que tem que ser exterminada.”

Scholastique falou sobre seu livro “A mulher de pés descalços”, destacando como, apesar de ser uma escrita sobre a sua mãe, é um livro sobre todas as mães que defenderam seus filhos no genocídio de Ruanda. “Eu comecei a escrever este livro e não sabia onde ia dar. A minha necessidade era me esvaziar das experiências que eu tinha vivido”, acrescentou. “Quando eu soube que tinha que fugir, chorei muito, pois sabia que tinha que deixar a minha mãe. (…) Eu parti em 1973 e o genocídio aconteceu em 1994. Mas, desde pequenos, a gente sabia que estávamos sendo preparados e que isso ia acontecer.”

“Nós saímos daqui mais plenos culturalmente, mais felizes e mais fortes”, destacou Jamil Chade, ao falar sobre sua participação neste Fliaraxá. Jamil celebrou a abertura da Embaixada do Brasil em Ruanda, ocorrida há poucos dias. “O que o Itamaraty não sabia é que Ruanda já tem embaixadora no Brasil. Ela está aqui com a gente”. Ele também relembrou que faltam poucos dias para o anúncio do Prêmio Nobel de Literatura e apontou para Scholastique dizendo: “Para bom entendedor, meia palavra basta”.

Jamil Chade falou sobre seu novo livro, “Tomara que você seja deportado”, cuja frase que dá título foi escutada por seu próprio filho no pátio de sua escola nos Estados Unidos, durante um período recente em que viveram naquele país. “A minha pergunta era: Como que uma frase dessa chega no pátio de uma escola de uma cidade bacana, de uma cidade progressista? Como que uma frase dessa ocupa esse lugar? Eu quero entender o que há por trás de tudo isso”, ele declarou. Jamil relaciona todo esse movimento à extrema desigualdade observada no mundo hoje. “A desigualdade hoje é obscena, ela é imoral. 1% da população mundial tem um patrimônio equivalente a 95% da população mundial. (…) Quem morre de fome hoje, morre assassinado”, ele prosseguiu de maneira contundente.

“Quando adulta — já vivia longe de Ruanda — me coloquei ao lado dos adultos que eram responsáveis pela reconstrução do país. No dia seguinte ao genocidio, tivemos que conviver uns com os outros. (…) Eu me coloquei ao lado daqueles que queriam reconstruir o país”. Ela comentou que seu livro “Kibogo subiu ao céu” lida com essa questão da reconstrução. “Através da solidariedade, reconstruir o país”, resumiu.

Ao final, Sérgio Abranches pediu para que o público presente celebrasse, com aplausos efusivos, os colaboradores do Fliaraxá reunidos no Teatro e a homenageada desta 13ª edição do festival, a grande Scholastique Mukasonga! 

Sobre o 13.º Fliaraxá

O 13.º Fliaraxá ocorre de 1.º a 5 de outubro, no Teatro CBMM do Centro Cultural Uniaraxá. O evento acontece em mesas de conversa com escritores, lançamentos de livros, prêmio de redação, atividades para as crianças, apresentações musicais, entre outras. Todas as atividades do Festival são gratuitas.

Há 13 anos, a CBMM apresenta o Festival Literário Internacional de Araxá – Fliaraxá –, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura, com a parceria da Bem Brasil e o apoio cultural do Centro Cultural Uniaraxá, da TV Integração e da Academia Araxaense de Letras.

Serviço:

13.º Festival Literário Internacional de Araxá – Fliaraxá

De 1.º a 5 de outubro, quarta-feira a domingo

Local: programação presencial no Teatro CBMM do Centro Cultural Uniaraxá (Av. Ministro Olavo Drummond, 15 – São Geraldo), e programação digital no YouTube, Instagram e Facebook – @‌fliaraxa

Entrada gratuita