Em seu 10.° ano, o Festival Literário de Araxá  –Fliaraxá – mantém a tradição de levar literatura à casa dos moradores da cidade no período que antecede o evento. Dessa forma, a partir do dia 27 de abril, algumas padarias do Município vão embalar os pães em sacos de pão personalizados com poesias. Desta vez, os poemas são de Itamar Vieira Junior, o Autor Homenageado desta edição do Fliaraxá. O público vai conhecer trechos dos poemas “Entre”, “México” e “Repetições” impressos em sacos de pão, de um, três e cinco quilos respectivamente. Serão distribuídas, no total, cerca de 30 mil embalagens.

Além de divulgar o Festival, que acontece entre os dias 11 e 15 de maio de modo presencial e digital, a ação tem por objetivo levar a literatura ao cotidiano dos araxaenses. De acordo com Afonso Borges, idealizador e criador do Festival, “distribuir sacos de pães com poemas torna a poesia acessível e parte do dia a dia das pessoas”.

Confira, na íntegra, os poemas de Itamar Vieira Junior que serão impressos nos sacos de pães da 10.ª edição do Fliaraxá:

 

ENTRE

Aventurar-se no espaço

entre a parede e a cama

tentando alcançar

o que pudesse ter entre as mãos

a luz trêmula

desenhando sombras no domínio

a boca seca

silenciosa como o aviso

agoniza o corpo

entre a cama e o abismo

as mãos mais que nuas

sentem o acaso

entre os dedos cresce

o que colheu neste vão

sujo, o corpo refuga

o metal

entre o abismo e a correnteza

algo que se movimente

como o começo

 

MÉXICO

 

Tudo que interessava nesta cidade

eram suas orillas

a crescerem em relevo

no que está além

não muito longe do vulcão

 

“su construcción fue uno de los pocos a resistir intacta”

diz o taxista olhando para o edifício

replicando o terremoto de 1985

quando alguma coisa aconteceu ao sul de meu corpo

 

uma placa tectônica engoliu outra placa

sete horas e dezenove minutos

chegou por aqui dois minutos depois de surgir no seu epicentro

e as palavras do trabalhador continuam a replicar

na chuva de outubro de 2014

culpa das correntes de ar que chegam do Pacífico

 

as orillas são gigantes

nelas estão os segredos sussurrados

o que nunca será ocultado

não há tempestade nem abalos

capazes de desfazê-las definitivamente

nada que as transforme em ruínas

 

um guarda-chuva gentil vem até a mim

naquela mesma noite de chuva

encolho para que nele se abriguem dois

em movimentos que provocam  pequenos choques de corpos

e mesmo assim tudo permanece de pé

 

REPETIÇÕES

 

Caminhei como se fosse tomar

o último trem para Londres

e sob as nossas cabeças, sob as copas das árvores

e os telhados das casas

pairava o silêncio

e sob o silêncio pairavam os aeroplanos com as armas

e sob as armas pairava a guerra

 

caminhei e sob os meus pés se abriram fendas

desprenderam-se rochas

e sob as rochas as mesmas vontades

que me acompanhavam em minhas derrotas

e sob o relógio sob o pêndulo sob o tempo sob os bolsos do meu sobretudo antigo sob as águas do rio Ouse e sob o peso que quase insistiu em flutuar

a necessidade de me revolver sob a tormenta

de pôr um ponto final em cada história

 

No banho toco a superfície

a nudez que guardamos sob a pele

libera nuvens de ar

se desprendem do corpo

invisíveis nuvens

e a espuma do sabonete que me torna escorregadia

e as bolhas, nuvens,

e o branco da espuma, nuvens

nuvens que hipnotizam  no ar

em meu habitat

convidam-me a reunir-me a elas

no céu do Rio de Janeiro

na luz de outubro de 1983

 

A morte me acompanha

se repete na estrada

meu pai

meus irmãos

minha neta

minha outra neta

minhas guerras

minhas palavras

os animais feridos

correm, voltam por este mesmo caminho

as palavras também correm

ou mesmo morrem

sem encontrar maneiras de se fazerem compreensivas

e tudo que me resta na manhã ensolarada

da cozinha do porão dos livros que não mais interessavam

da pacata vida atormentada de Ketchum

é realizar a última caçada

 

Sobre o Fliaraxá

O Festival Literário de Araxá foi criado em 2012 pelo jornalista e empreendedor cultural Afonso Borges, diretor-presidente da Associação Cultural Sempre um Papo. Em sua 10.ª edição, o Fliaraxá tem como tema “Abolição, Independência e Literatura” e ocorre em formato híbrido, ou seja, digital e presencialmente, em diversos locais da cidade: Grande Hotel, Teatro Municipal Maximiliano Rocha, Parque do Cristo, Fundação Cultural Calmon Barreto, praças e escolas de bairros periféricos.

O 10.º Fliaraxá é apresentado com exclusividade pelo Ministério do Turismo e pela CBMM, com o patrocínio da Cemig e do Itaú e apoio da Rede Mater Dei de Saúde, Grupo Zema, Prefeitura Municipal de Araxá, Fundação Cultural Calmon Barreto, Secretaria Municipal de Desenvolvimento, Turismo e Inovação Tecnológica, Central Única das Favelas – Cufa de Araxá –, com recursos da Lei Federal de Incentivo à Cultura, da Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo.

Serviço:

10.º Fliaraxá – Festival Literário de Araxá

De 11 a 15 de maio, de quarta-feira a domingo

Tema: “Abolição, Independência e Literatura”

Formato híbrido – transmissão em tempo real pelas plataformas do Festival: Youtube e Facebook do @fliaraxa

Locais: Grande Hotel, Teatro Municipal Maximiliano Rocha, Parque do Cristo, Fundação Cultural Calmon Barreto, em praças e escolas de bairros mais afastados do Centro

Informações para a Imprensa:

Jozane Faleiro | 31 99204-6367 | jozane@sempreumpapo.com.br