Por Gabriel Pinheiro
Encerrando a programação deste sábado, uma mesa mais do que especial reuniu a escritora Conceição Evaristo, a ministra do STF Cármen Lúcia (por vídeoconferência), a escritora Calila das Mercês e o curador e fundador do Fliaraxá, Afonso Borges.
“Os festivais literários permitem, neste tempo, um acordar no nosso sonho civilizatório. Todos têm o direito de ler um livro, de serem alfabetizados”, abriu a mesa a ministra Cármen Lúcia. Para a magistrada, “são os livros que realizam essa possibilidade da gente se reorganizar, viver com a gente mesmo, viver com o outro”. Segundo ela, estamos precisando como nunca da literatura. “Estamos vivendo numa democracia que ainda tem muito a fazer, muito a percorrer. A arte é a salvação da humanidade para mim. A literatura é o instrumento mais apropriado para que a gente tenha essa reorganização pessoal, política e social”.
A escritora Calila das Mercês é pesquisadora em pós-doutorado no programa coordenado por Conceição Evaristo na USP, mantendo uma relação de proximidade acadêmica e afetiva com Evaristo. Afonso Borges, então, provocou Mercês a direcionar algumas perguntas que nunca foram feitas para Conceição. No trabalho com Conceição no ambiente acadêmico, Calila declarou: “Pela primeira vez eu me senti vista”. Segundo ela, observar Evaristo no espaço acadêmico, ministrando disciplinas com turmas esgotadas, a faz acreditar no sonho, nesse comprometimento com o individual-coletivo que realmente faz a diferença.
Calila, então, fez sua primeira pergunta na noite: “O que a Conceição Evaristo de hoje diria para a Conceição Evaristo menina?” Conceição Evaristo, primeiro, declarou que Calila das Mercês representa o resultado de uma luta, o significado do chamado futuro-ancestral: “É essa força jovem que me potencializa”. Na sequência, Evaristo respondeu a Calila: “Eu diria para a Conceição menina que as coisas estão caminhando de acordo com os desejos dela. Desde pequena, ela previa, ela queria uma coisa que não sabia bem. Hoje, essa menina está aqui, ela cresceu e não perdeu os seus princípios”.
Na sequência, Calila perguntou o que hoje traz satisfação para Conceição. “O corpo da mulher negra foi sempre pensado pela sexualidade”, declarou Conceição, refletindo sobre a dificuldade do corpo negro em escrever sobre o prazer e o gozo, devido a essa sexualização histórica. Refletindo sobre a pergunta de Calila, Evaristo comentou o fato de ser a primeira mulher negra a entrar na USP como catedrática, com sua obra sendo pensada e refletida em diversos campos. “Mas o interessante não é ser a primeira: o mais importante é você abrir perspectiva.” Ela reafirmou o desejo de que esse acontecimento reverbere no coletivo.
Afonso Borges, então, perguntou para Conceição Evaristo: “O que você não aguenta mais que te perguntem?” Ela respondeu que talvez perguntas ou afirmações que enxergam a sua ascensão como um acontecimento apenas pessoal. Na sequência, Afonso destacou o aniversário de 70 anos da Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais, espaço fundamental na formação de Evaristo enquanto leitora — e, futuramente, autora. Uma de suas tias trabalhou no espaço, durante a infância da escritora: “Ela me permitiu adentrar no mundo dos livros”.
“Eu tatuei ‘escrevivência’ no meu corpo antes de sequer imaginar um dia trabalhar com Conceição Evaristo”, revelou Calila das Mercês. Para a jovem autora, conhecer Conceição a permitiu pensar na possibilidade de um dia também se tornar uma escritora. “Toda vez que eu te vejo é como se eu realizasse um sonho meu.”
Calila, então, perguntou: “Com o que você sonha hoje, Conceição?” A autora mineira disse que a primeira coisa com que sonha é com tudo aquilo que tem ainda para escrever, como criação literária e como crítica literária pela perspectiva negra: “O que eu mais sonho é continuar com essa vitalidade”. E também: “Mais do nunca é crer que o trabalho valha a pena, ter esperança”.
Ao fim, Afonso Borges convidou a escritora Eliana Alves Cruz ao palco para uma fala especial de encerramento para essa 12ª edição do Fliraxá. “É com o desejo de que a gente possa maternar a nossa nação, de que a nossas palavras sejam semente e que vocês continuem esse palavras, eu digo: muito obrigada pela escuta de vocês.”
Sobre o Fliaraxá
A CBMM apresenta, há 12 anos, o Festival Literário Internacional de Araxá, um festival literário com atividades acessíveis, inclusivas, antirracistas, éticas, educativas e em equilíbrio com a diversidade, economia criativa, raça, gênero e pessoas com deficiência. Toda a programação é gratuita, garantindo a democratização do acesso. O Fliaraxá tem, também, o patrocínio do Itaú, da Cemig e do Bem Brasil, via Lei Rouanet do Ministério da Cultura. Participam, na qualidade de apoio cultural, a Prefeitura de Araxá, a Fundação Cultural Calmon Barreto, a TV Integração, a Embaixada Francesa no Brasil, o Institut Français e a Academia Araxaense de Letras. Todas as atividades do Festival são gratuitas, com a curadoria nacional de Afonso Borges, Tom Farias e Sérgio Abranches e curadoria local de Rafael Nolli, Luiz Humberto França e Carlos Vinícius Santos da Silva.
Serviço
12.º Festival Literário Internacional de Araxá – Fliaraxá
De 19 a 23 de junho de 2024, de quarta-feira a domingo
Local: Programação presencial na Fundação Cultural Calmon Barreto (Praça Artur Bernardes, 10 – Centro), e programação digital no YouTube, Instagram e Facebook – @fliaraxa
Entrada gratuita
Informações para a imprensa: imprensa@fliaraxa.com.br
Jozane Faleiro – 31 99204-6367/ Letícia Finamore – 31 98252-2002